“A Metamorfose” ou a parábola do homem inseto de Franz Kafka

A manhã em que Gregor Samsa acorda e o livro começa é o princípio de uma inesperada e inexplicável metamorfose. O corpo desumaniza-se para se transformar num enorme inseto, mas debaixo da horrível carapaça, continua a pensar como um homem. Apesar do espanto da descoberta, o que mais o preocupa é a possibilidade de perder o emprego e a previsível reação violenta do pai. Porque a mutação de Samsa não é ainda a libertação de uma existência passiva e servil, cumprida numa rotina diária, opressora e castradora.

A nova forma condiciona-o e aprisiona-o a uma nova solidão. Fechado no quarto, o jovem caixeiro-viajante vê-se animal, rastejante e repugnante, incapaz sequer de abrir uma porta ao mundo exterior. Já não o entendem, mas ele continua a entender o que outros dizem à sua volta. Os outros são a família ociosa dependente do seu trabalho, os pais e a irmã que o parasitavam e que agora não conseguem evitar sentimentos de desprezo e repulsa pelo filho e irmão dedicado, obediente, responsável. O que resta a esta personagem fantástica, quase surreal? Sofrer a condenação anunciada nas primeiras linhas do conto de Franz Kafka. E nesse caminho sem retorno mostrar-nos fragilidades da condição humana.

“Certa manhã, ao acordar de sonhos inquietos, Gregor Samsa viu-se transformado num gigantesco  inseto.”

Escrita de forma simples, com palavras claras e frases curtas, a história de Gregor Samsa transformou-se em literatura universal. Publicada pela primeira vez em 1915, a pequena obra de Kafka tem muito do seu autor. Tal como esta personagem sem esperança, também ele é um judeu a viver em Praga, solitário, marginalizado por pertencer a uma minoria religiosa, fragilizado por um pai severo, mas sem falhar os deveres profissionais que lhe roubam tempo para a única coisa que o deixa feliz: escrever. Como se a escrita fosse o seu lugar seguro, onde enfrenta medos, desejos, onde procura saber o sentido da vida. Neste conto com mais de cem anos, a jornalista Alexandra Lucas Coelho procura o fio que o liga ao presente, a metamorfose que acontece em todos nós.

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