“Cabril”, de Jorge de Sousa Braga

Poeta e médico obstreta, Jorge de Sousa Braga tem sempre poesia por perto, a ler ou a escrever. E poemas seus, como este "Cabril", são citados de cor por muitos que lhe conhecem a obra. Versos que seguimos na leitura de Anabela Mota Ribeiro, no programa "Voz". Um encontro com a poesia para ver, ouvir e ler aqui.

Cabril

Esta noite sonhei que era um rio.
Um rio pequenino, é certo,
que nada mais conhecia além das montanhas onde nascia,
dos amieiros e dos juncos que nele se debruçavam.
Como todos os rios,
o que eu mais ardentemente desejava era desaguar.
Comecei a perguntar onde ficava o mar,
mas ninguém me sabia responder.
Apontavam-me com um gesto vago ora o este ora o oeste.
Escolhera já a forma de desaguar – em delta, claro –
mas não recolhera ainda o menor indício da proximidade do mar.
Uma noite em que estava acampado ente as dunas
cheguei finalmente a uma conclusão
(a mesma a que todos os rios chegaram talvez antes de mim):
o mar não existia.

(E essa conclusão era salgada.)

Jorge de Sousa Braga

Temas

Ficha Técnica

  • Título: "Voz"
  • Tipologia: Programa de Poesia
  • Autoria: Produções Fictícias
  • Produção: até ao Fim do Mundo
  • Ano: 2005