As constituições liberais de 1822 e 1826
A Constituição de 1822 revelou-se um documento progressista, radical para o seu tempo. O rei tinha pouca margem de atuação e o poder legislativo era unicameral. As Cortes faziam leis e controlavam o poder executivo. A Carta Constitucional de 1826 era mais conservadora. O rei tinha uma ampla capacidade de atuação. O poder legislativo era composto por duas câmaras: a dos deputados e dos pares, estes nomeados pelo rei.
A revolução de 1820 lançou as bases da primeira experiência liberal portuguesa e deu origem à primeira lei fundamental portuguesa: a Constituição de 1822. A Junta Provisional do Governo Supremo do Reino, órgão que liderou o país após a revolta do Porto de 1820, onde pontificavam os homens do Sinédrio, com especial destaque para Manuel Fernandes Tomás, ordenou que se procedesse à eleição de umas Cortes Constituintes que deveriam elaborar uma Constituição.
O primeiro texto constitucional português teria origem na soberania da Nação. Segundo as instruções de 22 de novembro de 1820 as eleições seriam indiretas e em três graus: juntas eleitorais de freguesia; assembleias eleitorais e comarca e assembleias eleitorais de província. Podiam votar todos os cidadãos masculinos maiores de 25 anos.
Os debates nas Cortes Constituintes foram demorados e bastante acesos, destacando-se a questão dos poderes reais; o direito de voto; a composição do poder legislativo ou a organização do poder executivo.
No final, a Constituição de 1822 surgiu como um texto bastante progressista para a época, inspirado na Constituição de Cádis de 1812, e apresentava a separação dos poderes. O poder executivo era entregue ao rei que nomeava o governo e não podia demiti-lo. O governo não tinha iniciativa legislativa e era responsável perante as Cortes, que representavam a Nação através do voto.
A eleição dos deputados às cortes deveria ser direta e secreta e poderiam votar os cidadãos maiores de 25 anos com algumas limitações. O poder legislativo estava na posse de uma única câmara: as Cortes. Deveria ser eleita por dois anos, 1 deputado por 30 000 habitantes, e tinha como funções: apresentar e votar leis; fiscalizar e controlar o poder executivo. O poder judicial entregue aos tribunais que eram autónomos e independentes com juízes perpétuos e inamovíveis, nomeados pelo rei.
A Constituição de 1822 foi aprovada em 23 de setembro de 1822 e esteve em vigor apenas até maio de 1823, quando se deu o golpe da Vilafrancada. No entanto, é uma marca do liberalismo português e será sempre uma referência para os liberais mais progressistas, conhecidos como vintistas.
A Constituição de 1822 nunca foi aceite pelas forças mais tradicionalistas, desde logo os absolutistas, liderados por D. Miguel e pela mãe, D. Carlota Joaquina, mas também pelos liberais mais moderados, adeptos de uma maior conciliação entre os antigos grupos privilegiados e os novos critérios sociais. A conjuntura internacional também não ajudou e em 1823 o triénio liberal findou em Espanha com a invasão por tropas francesas, dispostas a acabar com as ideias revolucionárias na Europa. Perante o medo de tal destino em Portugal a Vilafrancada, em 1823, e a Abrilada em abril de 1824, ambas lideradas por D. Miguel, reconduziram Portugal aos princípios de uma sociedade tradicionalista e aboliram o sistema constitucional.
Após a morte de D. João VI sucedeu-lhe D. Pedro IV, imperador do Brasil. D. Pedro estava disposto a conciliar a sociedade portuguesa dentro do quadro liberal e avançou com um novo texto constitucional: a Carta Constitucional de 1826. Este texto era bastante mais moderado. Desde logo ele nasce da vontade real e não da legitimidade da Nação. A separação dos poderes é mantida, mas ao executivo, legislativo, judicial foi acrescentado um quatro poder, privativo do rei: o poder moderador.
O poder executivo pertencia ao rei que nomeava o governo podendo também demiti-lo. O poder legislativo era bicameral: câmara dos deputados, eleita pelos cidadãos eleitores, por sufrágio indireto e censitário; câmara dos pares nomeada pelo rei, hereditária, vitalícia e sem número fixo. É neste último contexto que o rei pode usar o poder moderador que se estende ao veto absoluto das leis e à dissolução das cortes. O poder judicial é composto pelos tribunais com juízes nomeados pelo rei.
Desta forma, a Carta Constitucional foi um documento que tentou equilibrar a sociedade portuguesa, mantendo a legitimidade da Nação, através da eleição da câmara dos deputados, equilibrada pelo poder real que nomeava a segunda câmara, por proposta do governo, onde estavam representados os titulares e os grandes proprietários, elementos mais conservadores. A Carta Constitucional deu origem a outra corrente mais moderada da política portuguesa: o cartismo.
Síntese:
- A Constituição de 1822 revelou-se muito radical para a época: rei com poucos poderes e um sistema unicameral.
- A Carta Constitucional de 1826 tentou alcançar um equilíbrio entre liberais conservadores e mais progressistas, ao mesmo tempo que procurou integrar os absolutistas.
- Constituição e Carta estabeleceram o nascimento de duas grandes famílias políticas em Portugal: os vintistas, liberais progressistas, e os cartistas, liberais mais conservadores.
Ficha Técnica
- Área Pedagógica: Caracterizar o sistema político estabelecido pela Constituição de 1822. Reconhecer o carácter mais conservador da Carta Constitucional de 1826.
- Tipologia: Explicador
- Autoria: Associação dos Professores de História/Nuno Pousinho
- Ano: 2021
- Imagem: Alegoria à Constituição de 1822, Domingos Sequeira