“O Estrangeiro” em BD: revisitar o clássico de Camus
Primeiro desafio: dar um rosto a Mersault, o protagonista sem esperança, indiferente à sua existência e ao fluxo absurdo da realidade que Albert Camus condena à morte sem deixar uma única pista sobre a aparência física. Desenhar uma das novelas mais lidas do escritor francês requeria algum atrevimento, certamente estudo e mão experiente. A história singular entrou na imaginação de um ilustrador também nascido em Argel e, muitas leituras depois, Jacques Fernandez decidiu avançar com a adaptação gráfica. Foi quando "O Estrangeiro", publicado em 1942, ganhou uma segunda vida aos quadradinhos.
Inventar imagens para um dos romances mais famosos do século XX. O desafio não é fácil, mas Jacques Fernandez sentiu-se inspirado por esta história desconcertante em que um homem parece viver resignado e sem emoções o absurdo da existência humana. A adaptação da novela suscitava algumas dificuldades, pedia investigação, nomeadamente sobre os anos 30 do século passado, época em que decorre a ação de “O Estrangeiro”. No entanto o desenhador e argumentista tinha a vantagem de conhecer bem Argel; afinal a cidade que servia de cenário à obra de Albert Camus era a terra natal que partilhava com o escritor francês, os dois nascidos no mesmo bairro pobre. Pior terá sido dar vida a Mersault.
O que fazer quando um livro dispensa apresentações físicas da personagem principal, quando não há palavra a iluminar o traço? Como um qualquer leitor, o desenhador deixa-se levar pela imaginação, procurando sentidos escondidos no texto original até a mão encontrar as linhas certas. Até chegar a uma nova obra, visual, gráfica, que nos conduz a leituras diferentes deste clássico que tem um dos começos mais célebres da literatura: “Hoje a mãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem.”
Temas
Ficha Técnica
- Título: Literatura Aqui
- Tipologia: Extrato de Programa Cultural - Reportagem
- Produção: até ao Fim do Mundo
- Ano: 2015