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Os obstáculos à modernização portuguesa na primeira metade do século XIX

Os obstáculos à modernização portuguesa na primeira metade do século XIX

Portugal, nação comercial por excelência, passou ao lado da industrialização no início do século XIX. A exclusividade económica com o Brasil dava segurança económica. Porém, as invasões francesas, entre 1807 e 1810, colocaram um fim a este mundo. A instabilidade política que se seguiu, primeiro entre absolutistas e liberais (1820-1834) e depois entre liberais (1834-1851) não permitiu lançar as bases da modernização económica.

O progresso económico oitocentista não foi uniforme em todo o continente europeu. Houve países que tiveram um desenvolvimento mais lento. Foi o caso de Portugal, essencialmente devido à conjuntura política e às dificuldades de implantação do Liberalismo.

No início do século XIX, Portugal vivia um período de prosperidade. O centro da atividade económica estava baseado no Atlântico onde o Brasil desempenhava o papel nuclear. O fluxo comercial entre Lisboa e as terras brasileiras cimentou-se desde o final do século XVII, com a descoberta do ouro. Desde então estabeleceu-se uma corrente migratória entre o continente e o sul da América, permitindo que as trocas comerciais com os dois lados do Atlântico se tornassem fundamentais para a economia nacional.

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Portugal estabeleceu com o Brasil os princípios protecionistas: a colónia tinha exclusividade comercial com a metrópole; enviava matérias primas e recebia todo o tipo de produtos das manufaturas nacionais. Na realidade, até 1807 Portugal passava por um período de crescimento económico, baseado na grande atividade comercial e passando ao lado das grandes transformações industriais que se começavam a operar em Inglaterra.

Este mundo, aparentemente perfeito, deu continuidade à política secular do país: voltado para o mar e para o seu império, distanciando-se dos problemas europeus. Porém, a guerra europeia, fruto das investidas da França revolucionária e de Napoleão, modificou a realidade.

Portugal viu-se envolvido nas contendas europeias quando o imperador dos franceses decretou o bloqueio continental em 1806, com o objetivo de derrotar a Inglaterra. Os portos nacionais teriam de se fechar ao comércio inglês, o que punha em causa o equilíbrio da balança comercial portuguesa, já que a Inglaterra era um dos destinos dos produtos brasileiros.

A família real e toda a Corte abandonaram Lisboa com destino ao Brasil. Portugal assistiu a três invasões francesas, entre 1807 e 1810, e perante a ocupação francesa o príncipe D. João, regente do reino, abriu o os portos brasileiros ao comércio internacional, em 1808, e em 1810 concluiu um tratado de comércio com a Inglaterra que arruinou as finanças públicas portuguesas. Portugal perdeu a exclusividade económica com o Brasil e teve de enfrentar uma longa guerra que arruinou a agricultura, a indústria e ficou sobre administração inglesa até 1820.

A revolução liberal de 1820 procurou reanimar a economia nacional, tendo como objetivo recuperar o comércio brasileiro. Esta hipótese cedo se percebeu que não seria possível e o Brasil proclamou a sua independência em 1822. Portugal viu-se privado da sua principal fonte de receitas e tinha de reconfigurar a sua economia, apostando na indústria e reativação da agricultura para aumentar a produção interna. Porém, as convulsões políticas entre liberais e absolutistas que se estenderam até 1834 não permitiram o arranque económico.

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Após a guerra civil de 1832-34 os liberais tiveram a ilusão de relançar a reconstrução do país. A legislação de Mouzinho da Silveira tinha como objetivo liberalizar a economia nacional, acabando com os entraves económicos do Antigo Regime, baixar impostos e estimular a livre iniciativa para aumentar as transações e a riqueza.

No entanto, as divergências políticas continuaram a existir, agora entre liberais, o que, mais uma vez, impediram o progresso económico. Os golpes militares, as quedas de governo sucederam-se e nenhuma corrente liberal conseguiu a pacificação política que permitisse colocar o país na rota do desenvolvimento material, prevalecendo a dependência dos mercados externos.

O projeto setembrista, entre 1836 e 1842, procurou estimular a indústria através de medidas protecionistas, a aposta no ensino técnico e renovar o projeto colonial, tentando construir novos brasis em África. O cabralismo, entre 1842 e 1846, alinhou também pelo protecionismo e lançou um amplo pacote de reformas tendentes a obter receitas, através de mais impostos e de impopulares reformas políticas, com a intenção de construir vias de comunicação que permitissem o desenvolvimento económico.

A reação ao projeto cabralista foi brutal e lançou o país em revoltas anti fiscais, como foi o caso da Maria da Fonte e uma nova guerra civil entre 1846 e 1847. A guerra civil da Patuleia, entre liberais anti cabralistas e cabralistas, deixou o país numa situação económico-financeira lamentável.  De facto, durante a primeira metade do século XIX, Portugal atrasou-se no processo de industrialização, na renovação do sistema de transportes e de toda a alteração estrutural da economia, devido às sucessivas crises políticas.

A relativa acalmia chegou em 1851 com a Regeneração, que permitiu o lançamento do desenvolvimento material.

Síntese:

  • O Liberalismo português viu-se confrontado com uma terrível crise económica, fruto das invasões francesas, da perda do Brasil e da conflitualidade política que se lhe seguiu.
  • A vitória dos liberais em 1834 permitiu lançar as bases do Portugal novo, sendo a legislação de Mouzinho da Silveira determinante.
  • A evolução política deu origem a vários projetos políticos e económicos, destacando-se as propostas setembristas e cabralistas.

Temas

Ficha Técnica

  • Área Pedagógica: Referir os obstáculos à modernização portuguesa na primeira metade do século XIX.
  • Tipologia: Explicador
  • Autoria: Associação dos Professores de História/Nuno Pousinho
  • Ano: 2021
  • Imagem: Lisboa vista do Palácio do Marquês de Abrantes (1.ª metade séc. XVIII) - Museu de Lisboa