Ruy Cinatti, o poeta antropólogo
Autor de uma poesia despojada, Ruy Cinatti encanta-se pelas terras e gentes de Timor e teme pelo futuro da colónia portuguesa. Denuncia a "cobiça dos indonésios", alerta para os perigos da descolonização. Mas os poderosos não o ouvem e um povo é massacrado.
Foi um homem do mundo, viajante da Europa, África e Oriente, um observador atento da natureza, mas só em Timor tem o apelo de uma terra que toma como sua. O antropólogo não resiste aos rituais desta nova cultura, o poeta fica preso ao exotismo de uma ilha que mora em paragens distantes.
“Tudo me é novo e estranho”, escreve Ruy Cinatti no primeiro encontro com a colónia portuguesa em 1946, onde vai exercer o cargo de chefe do Gabinete do Governador e, mais tarde, chefe dos Serviços de Agricultura do Governo de Timor. A ilha, que fotografa e filma, transforma-se no centro da sua vida. Em 1956 alerta para a “cobiça dos indonésios” e, depois do 25 de Abril, pressente que algo de mau vai acontecer “àquela gente portuguesa”. Desesperado, procura ajuda para evitar a descolonização e escreve “Timor-Amor”. Em vão. A ilha é invadida. Cinatti já não vai assistir à concretização do sonho da independência que acontecerá 24 anos depois.
O poeta antropólogo que nasceu em Londres e que em pequeno é levado a viver no Ribatejo, fez Agronomia na Universidade de Lisboa e Antropologia Social e Etnográfica em Oxford. Publicou os primeiros versos (“Ossobó”) com 21 anos. Nos “Cadernos de Poesia”, que funda juntamente com Jorge de Sena, José Blanc de Portugal e Tomás Kim, procura “um programa de autenticidade poética”, longe das correntes em vigor. A sua escrita é marcada por palavras claras, pelo rigor, por uma aparente simplicidade reveladora do homem profundamente religioso que é.
Ao longo da sua vida são muitos os livros publicados e os galardões atribuídos. “O Livro do Nómada Meu Amigo” tem o Prémio Antero de Quental; “Uma Sequência Timorense” é Prémio Camilo Pessanha e “Sete Septetos” recebe o Prémio Nacional de Poesia.
Nos últimos anos de vida conhece uma tal solidão que o faz dizer “hei de morrer como um rato na sarjeta”. O poeta que “não era deste mundo” morre a 13 de Outubro de 1986, aos 71 anos.
Neste artigo recuperamos o testemunho do poeta Fernando Pinto do Amaral sobre a importância da publicação da Obra Poética de Ruy Cinatti.
Temas
Ficha Técnica
- Título: Uma Questão de Palavras
- Tipologia: Magazine de Informação
- Autoria: Luísa Mellid-Franco
- Produção: Videofono
- Ano: 1992