“Anna Karénina”: a trágica heroína de Lev Tolstoi

Esta ficção começa na realidade, inspirada numa mulher abandonada pelo amante, com o coração despedaçado e o corpo atropelado por um comboio. Lev Tolstoi viu os restos mortais na estação perto de sua casa, em Isnaia Poliana, a sul de Moscovo, e fez o que de melhor sabia fazer: construiu um romance inesquecível. Ao livro prende-nos a história de um amor sem a possibilidade de ser feliz.  

Tolstoi numa estação de comboio, cenário decisivo do romance

Mas Anna Karénina não se resume a drama, traição, ciúme, tragédia. Retrata uma Rússia em declínio; cruel, injusta, brilhante e mística, salienta a jornalista Alexandra Lucas Coelho neste episódio da “Volta ao Mundo em Cem Livros”.  Através de uma escrita simples, realista, atenta ao pormenor, viajamos a este final de século com Tolstoi, também ele infiltrado no enredo da paixão fatal.

Em Lévin, a personagem, ressoam dados biográficos de Lev, o escritor. Os dois abastados proprietários rurais, empenhados em fazer o bem, a viverem na alegria e na harmonia responsável do casamento religioso. Lévin está do lado certo do Amor, Anna corrompe o sentimento mais puro na relação extraconjugal mantida com o conde Vronski. A questão é de ordem moral e a protagonista entra em queda social, castigo sem possibilidade de redenção. 

Neste tempo e nesta sociedade onde moralismo se confunde com hipocrisia, as mulheres não tinham direitos, muito menos podiam cometer crimes desta natureza. Já os homens, tinham aventuras e todas permitidas. Mas não será Tolstoi a salvar a sua heroína da morte que a espera no metal frio dos carris. Inevitável desfecho para o romance que abre com a frase poderosa, repetida por gerações inteiras desde que foi publicado, em 1877: Todas as famílias felizes são iguais, mas cada família infeliz é infeliz à sua maneira.  

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