João Vieira: fazer poesia com pintura
Queria fazer poemas com pintura e começou a pintar letras. Os quadros de João Vieira reinventam a escrita, viajam por uma caligrafia mágica e misteriosa, um jogo visual que nasce no gesto espontâneo do artista. Neles, encontramos rastos de poesia.
Antes de pintar “quadros por letras”, João Vieira (1934-2009) estudou na ESBAL, Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa. Ali aprende as técnicas do neorrealismo e compõe cenas rurais e de pesca. Porém, o ensino oficial não o preenche, e ao fim de dois anos abandona o curso. É no ambiente estimulante das tertúlias do Grupo do Café Gelo que encontra um espaço de liberdade, de oposição ao regime, de novas ideias e ideais. Aqui conhece Herberto Hélder, Mário Cesariny, Hélder Macedo, alguns dos poetas com os quais desenvolve uma ligação criativa. Da poesia irá extrair as letras singulares da sua pintura.
O pintor de raízes transmontanas em Valpaços, é depois bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris. Aluno de Henri Goetz, na Académie de la Grande Chaumière, trabalha com Arpad Szenes, descobre diferentes linguagens abstratas, gestualistas e experimentalistas que vão sustentar as suas composições. Em 1958, na capital francesa, funda o Grupo KWY com os companheiros do Café Gelo: René Bértholo, José Escada e Gonçalo Duarte, juntamente com Lourdes Castro, Christo e Jan Voss. Colabora na revista com o mesmo nome .
Nas viagens pela Europa faz o seu mapa da arte contemporânea. Em Londres, é seduzido pela multidisciplinariedade artística da cultura pop. Por cá, arrisca na experiência da conjugação de diferentes técnicas e artes. É o primeiro a fazer “ações-espetáculo” em Portugal. Fica célebre a que realiza na Galeria Judite da Cruz que termina com a destruição das obras expostas. Em 1968 começa a criar cenários para a RTP e para o teatro. No mesmo ano é distinguido com o Prémio do Círculo de Teatro Latino de Barcelona.
Nas suas obras, João Vieira expõe a obsessão da caligrafia, das letras e do corpo que as forma que pode sugerir figuras humanas e de animais. Os alfabetos latino e grego, os textos de Cesário Verde e Herberto Hélder são uma base sólida de trabalho. De uma forma transgressora, explora materiais estranhos às artes, como poliuretano rígido, espumas flexíveis ou tinta de automóveis. Depois da sua morte, aos 74 anos, é galardoado com o Grande Prémio Amadeo de Souza-Cardoso .
Ficha Técnica
- Título: Grandes Quadros Portugueses
- Tipologia: Extrato de Programa
- Produção: Companhia de Ideias
- Ano: 2012