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A Guerra Fria e a perpetuação do Estado Novo

A Guerra Fria e a perpetuação do Estado Novo

A perpetuação dos regimes fascistas peninsulares enquadrou-se num contexto de Guerra Fria, mais propriamente na política de contenção do comunismo, tendo Portugal e Espanha sido aceites na ONU em 1955. Portugal foi ainda convidado como membro fundador da NATO devido à sua posição geoestratégica, especificamente da base das Lajes nos Açores, cujo uso foi cedido aos Aliados na fase final da guerra.

Portugal fez o primeiro pedido de adesão à ONU, em agosto de 1946, alegando a sua suposta política de neutralidade durante a 2ª Guerra Mundial e a cooperação com os Aliados na fase final da guerra, cedendo a utilização da base das Lajes, na ilha Terceira dos Açores.

Os EUA, o Reino Unido e a França apoiaram este pedido com base no auxílio providenciado por Portugal aos refugiados durante a guerra, mas na realidade esse apoio enquadrava-se no cenário de emergência da Guerra Fria. Logo em 1945 começara a verificar-se um distanciamento progressivo entre os EUA e a URSS, anteriores Aliados contra o nazismo.

A manutenção das forças soviéticas nos países por si libertados e a ingerência sucessiva de Estaline na política desses países, nomeadamente o apoio aos partidos comunistas e à formação de democracias populares foi alterando o quadro geopolítico na Europa. Daí que a posição geoestratégica de Portugal fosse a verdadeira razão do convite dos EUA, Reino Unido e França para a entrada de Portugal na ONU. No entanto esta foi vetada pela URSS alegando as relações de proximidade de Salazar com Hitler e Mussolini.

Admissão de Portugal na ONU
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Nessa altura, o MUD (oposição democrática portuguesa) denunciou internacionalmente o caráter ditatorial do regime de Salazar. A sua tentativa de chamar a atenção para a falta de liberdade e para a atuação da polícia política e da censura não teve a repercussão desejada, tendo antes desencadeado a proibição do MUD e a prisão de muitos opositores, sendo alguns enviados para o Tarrafal.

O pedido de adesão à ONU foi sendo reapreciado anualmente, ressentindo-se da agudização da Guerra Fria: em 1947, o presidente Truman, dos EUA, anunciou a política de contenção do comunismo para contrapor ao controlo de Estaline sobre os países de Leste; entre 1948 e 1949 houve o bloqueio de Berlim e a divisão da Alemanha em duas; em 1949, os EUA iniciaram as negociações com os seus aliados da Europa ocidental e o Canadá para formar a NATO ou OTAN (Organização do Tratado Atlântico Norte), quebrando o seu tradicional isolacionismo. Portugal foi também convidado a entrar na NATO devido à importância geoestratégica da base das Lajes (que já houvera sido alvo de um acordo bilateral entre Portugal e os EUA em 1948).

Assim, Portugal entrou na NATO a 4 de abril de 1949, como membro fundador, o que revelava a aceitação do caráter anticomunista do regime salazarista pelas democracias ocidentais. Salazar via, assim, legitimada a sua luta anticomunista a nível internacional. Os militares esperavam que a cooperação com as forças da NATO contribuísse para a modernização das forças armadas. Na oposição, a integração na NATO, operou uma cisão entre os democráticos que esperavam uma aceleração de mudanças democráticas e os comunistas que viam a NATO como uma instituição militar ao serviço do capitalismo. Na realidade o regime endureceu a repressão interna perseguindo-se os apoiantes de Norton de Matos (campanha presidencial de 1949) e, em particular, os comunistas.

ONU contra colonialismo português
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A admissão de Portugal como estado membro da ONU só aconteceu a 14 de dezembro de 1955, na sequência de um acordo geoestratégico entre EUA e URSS (após a morte de Estaline) que incluiu mais quinze países, entre os quais a Espanha. Para Salazar isto significou a derrota da oposição interna, que alegava que o país estava isolado internacionalmente, e o acesso ao Tribunal Internacional de Justiça para denunciar as pretensões da Índia de Nehru sobre o Estado Português da Índia, tendo usado esse direito logo no dia seguinte à adesão.

Apesar de ter perdido o Estado Português da Índia, Salazar ganhou a questão no Tribunal e percebeu que podia usar instrumentos legais para manter as colónias, alegando que a Constituição de 1951, onde se definia o país como Estado unitário com províncias ultramarinas, estava em vigor à data da entrada de Portugal na ONU. A presença na ONU viria a revelar-se um foco permanente de tensão, ficando Portugal cada vez mais isolado por violar o princípio da autodeterminação dos povos.

Síntese:

  • A perpetuação dos regimes fascistas português e espanhol serviu os interesses da política de contenção do comunismo dos EUA no contexto da Guerra Fria.
  • A entrada de Portugal na NATO, como membro fundador, deveu-se à sua posição geoestratégica, especificamente da base das Lajes nos Açores.
  • O processo de integração de Portugal na ONU, de 1946 a 1955, ressentiu-se do ambiente de Guerra Fria e dos interesses geoestratégicos dos EUA e da URSS.
  • A Salazar interessava integrar a NATO e a ONU para mostrar à oposição que não estava isolado internacionalmente, como esta alegava, apesar de tal se ter vindo a verificar.

Temas

Ficha Técnica

  • Área Pedagógica: Relacionar a perpetuação dos regimes fascistas peninsulares com a consolidação da Guerra Fria. Reconhecer na entrada de Portugal na OTAN (como membro fundador) e na ONU reflexos da aceitação ocidental do regime salazarista.
  • Tipologia: Explicador
  • Autoria: Associação dos Professores de História/ Mariana Lagarto
  • Ano: 2021
  • Imagem: Norton de Matos discursa em comício no Porto, Casa Comum/ Fundação Mário Soares