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O problema da demarcação entre ciência e pseudociência

O problema da demarcação entre ciência e pseudociência

Neste explicador vamos abordar o que é a ciência e a pseudociência e utilizando critérios de verificabilidade e de falsificabilidade, estabelecer uma distinção entre ambas.

O QUE É A CIÊNCIA?

A ciência é uma atividade humana que consiste em procurar, de forma sistemática e rigorosa, explicação para os mais diversos aspetos e acontecimentos do mundo. Aqueles que se dedicam a tal atividade, os cientistas, fazem observações e medições cuidadosas, concebem e realizam experiências, com vista a desenvolverem hipóteses explicativas que sejam rigorosamente testadas. Dessa atividade resulta um vasto e diversificado conjunto de teorias explicativas a que damos o nome de conhecimento científico.

Seja pelo tipo de explicações apresentadas, seja pelas suas aplicações práticas, a ciência tem influenciado imenso as nossas vidas, permitindo-nos viver com mais conforto material e durante mais tempo. A ciência também nos dá poderes muito grandes, que envolvem riscos e responsabilidades acrescidas.

O QUE É A PSEUDOCIÊNCIA?

Há, contudo, atividades que geralmente não são classificadas como ciências mas que se apresentam como se o fossem. Por isso são chamadas pseudocientíficas. Muitas pessoas pensam que o uso indevido do nome da ciência, além de enganador, é prejudicial para a  própria ciência, tal como é prejudicial usar notas falsas como se elas fossem dinheiro verdadeiro. Por isso consideram importante traçar claramente um critério de cientificidade que permita distinguir o que é científico do que, não o sendo, se apresenta como tal.

O PROBLEMA DA DEMARCAÇÃO: CIÊNCIA E PSEUDOCIÊNCIA

Como distinguir, então, ciência de pseudociência? Este é o chamado problema da demarcação. Trata-se de um problema na medida em que, tal como as notas falsas podem ser muitíssimo parecidas com dinheiro verdadeiro, também as pseudociências podem ter a aparência da ciência genuína. Por exemplo, serão as teorias dos astrólogos realmente científicas? É a psicanálise uma ciência? Têm sido usados diferentes critérios de demarcação, entre os quais se destacam o critério da verificabilidade e o critério da falsificabilidade.

O critério da verificabilidade

Há quem considere que a ciência se distingue da pseudociência pelo facto de aquela, ao contrário desta, propor teorias constituídas por afirmações suscetíveis de serem empiricamente verificadas, isto é, afirmações cuja verdade pode ser provada por meio da experiência. Daí esta perspetiva ser designada verificacionista. Muitos defensores do verificacionismo consideram que a astrologia, por exemplo, é uma pseudociência por apresentar teorias ou previsões que, apesar de os astrólogos insistirem que sim, não são empiricamente verificáveis. Os verificacionistas alegam que a ciência assenta em provas rigorosas, obtidas por meio da observação cuidadosa e da experimentação, ao passo que as teorias dos astrólogos geralmente não passam de meras especulações sem grande sustentação empírica.

O verificacionismo começou por ser uma perspetiva acerca do significado das afirmações, defendida por filósofos positivistas. Outros adotaram a verificabilidade também como critério de cientificidade. Contudo, os próprios positivistas tinham reconhecido que esse critério não é aplicável ao caso da ciência, dado não ser possível verificar empiricamente leis científicas como, por exemplo, “Todos os metais dilatam sob a ação do calor”, uma vez que as leis são afirmações universais, aplicáveis a todos os casos, sem exceção: passados, presentes e futuros. Ao incluirem casos que nunca foram ou virão a ser observados, segue-se que esse tipo de afirmações universais não são empiricamente verificáveis. Por isso, alguns positivistas reformularam a ideia, argumentando que, apesar de, em rigor, as afirmações universais não poderem ser verificadas, elas podem ainda assim ser empiricamente confirmadas por um número suficientemente elevado de casos concordantes. Substituem, então, a ideia de verificação empírica pela de confirmação empírica, que consideram mais adequada.

O critério da falsificabilidade

Mas há filósofos, como Karl Popper, que consideram que nem sequer o critério da confirmação permite distinguir a ciência da pseudociência, alegando que os cientistas são igualmente incapazes de confirmar as afirmações universais da ciência. Popper argumenta que nenhuma quantidade de observações concordantes com as afirmações universais da ciência é suficiente para provar a sua verdade. Nada nos garante que não venhamos a descobrir um pedaço de metal ainda não observado e que seja diferente de todos até então vistos. Assim, para provarmos a verdade de que todos os pedaços de metal dilatam sob a ação do calor, teríamos mesmo de observar cada um dos pedaços de metal que há no mundo, o que é manifestamente impossível.

Em vez disso, o que distingue a ciência é, de acordo com Popper, o facto de as afirmações ou teorias científicas serem submetidas a testes rigorosos. Ora, testar uma teoria é pô-la à prova, o que não se faz tentando provar que é verdadeira. Pôr uma teoria à prova é antes imaginar possíveis casos que a refutem e tentar seriamente encontrá-los. Se for observado algum caso incompatível com a teoria, então a teoria é falsificada. Assim, testar uma teoria é tentar mostrar que ela é falsa. E para isso, sublinha Popper, basta encontrar um único caso incompatível com ela. Portanto, além do carácter explicativo das teorias científicas, a marca distintiva da ciência é a constante tentativa de conceber testes que falsifiquem as teorias propostas. Para isso, é preciso que as teorias sejam constituídas por afirmações falsificáveis, que é precisamente o que não acontece com as teorias pseudocientíficas. Assim, a afirmação de que as pessoas do signo de Leão tendem a ser bons líderes ou a previsão de que alguns nativos de Balança irão receber uma boa proposta de emprego no próximo mês não são falsificáveis, na medida em que nem sequer temos ideia do que teríamos de observar no sentido de mostrar a sua falsidade: a primeira é compatível com a existência de pessoas do signo Leão que não sejam bons líderes; a segunda é compatível com a existência de nativos de Balança que não recebam proposta de emprego alguma. Sabemos que qualquer delas é verdadeira, sem sequer precisarmos de observar seja o que for. Daí que nenhuma delas tenha qualquer interesse científico. E esta é a marca da pseudociência: produzir afirmações ou teorias infalsificáveis.

O método científico: indutivismo e falsificacionismo
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O método científico: indutivismo e falsificacionismo

Em resumo:

  • A ciência é uma atividade que consiste na procura sistemática de explicações rigorosas e cuidadosamente sustentadas para o que acontece no mundo. É também o corpo de conhecimentos que resultam dessa atividade.
  • A pseudociência consiste na apresentação de teorias que procuram passar por científicas sem o serem.
  • O problema da demarcação é o de distinguir corretamente a ciência da pseudociência.
  • Há quem proponha a verificabilidade como critério de demarcação: as teorias científicas são as que, ao contrário das pseudocientíficas, se pode provar empiricamente que são verdadeiras.
  • Popper, pelo contrário, defende que a falsificabilidade é o critério de demarcação: uma teoria é científica na medida em que, além do seu caráter explicativo, ela é falsificável por meio de testes empíricos.

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Ficha Técnica

  • Título: O problema da demarcação entre ciência e pseudociência
  • Área Pedagógica: Filosofia
  • Tipologia: Explicador
  • Autoria: Aires de Almeida
  • Ano: 2020