A noção de conhecimento
A possibilidade de conhecimento: o desafio cético
Podemos ter conhecimento de coisas, conhecimento prático e conhecimento declarativo (ou proposicional). O que nos interessa aqui é este último. Tradicionalmente são indicadas pelo menos três condições necessárias do conhecimento, em sentido proposicional: a crença, a verdade e a justificação.
As questões relacionadas com o conhecimento em geral (o que é, de onde vem, que coisas podemos conhecer ou saber, como sabemos, etc.) fazem parte da epistemologia, a disciplina filosófica cujo nome deriva da palavra grega episteme, que significa precisamente conhecimento.
Três noções de conhecimento
Porém, podemos falar de conhecimento em três sentidos diferentes, que são os seguintes:
O sentido que aqui interessa é o de conhecimento declarativo, também designado conhecimento proposicional ou saber que.
Três condições necessárias do conhecimento
Neste sentido, considera-se tradicionalmente que o conhecimento tem pelo menos três componentes (ou condições necessárias): a crença, a verdade e a justificação.
A justificação é a condição que tem gerado mais discussão, nomeadamente sobre o que é exatamente uma justificação apropriada.
Duas fontes de justificação
Os racionalistas defendem que a principal fonte de justificação é a razão (a capacidade de pensar) e os empiristas defendem que a principal fonte de justificação é a experiência (o que resulta dos sentidos). Os céticos discordam de ambos, pois pensam que nenhum fonte é satisfatória e, portanto, que nenhuma justificação é apropriada.
A questão da possibilidade do conhecimento
Os céticos desafiam a ideia de que o conhecimento é sequer possível. Mas em que se baseiam os céticos para considerarem que nenhuma justificação é adequada e, portanto, que o conhecimento não é possível?
Três argumentos céticos
Um dos argumentos céticos visa mostrar que muitas das nossas crenças não passam de meras opiniões. A ideia é que há sempre opiniões diferentes, ou mesmo opostas, sobre o mesmo assunto, mesmo entre os ditos entendidos nas matérias em causa (médicos, economistas, advogados, etc.). A única explicação para haver diferentes opiniões é nenhuma das justificações que as sustentam serem convincentes. Ora, se não são convincentes, então também não podem ser boas justificações. Assim, nada que seja matéria de opinião poderá ser considerado conhecimento.
Contudo, há crenças que não são uma questão de opinião: por exemplo, as que dependem dos nossos sentidos (do que vemos, ouvimos, etc.). Mas também estas carecem de justificação adequada, isto é, de uma justificação que exclua a possibilidade de nos enganarmos. Ora, tantas vezes nos sentimos enganados pelos nossos sentidos, quer se trate de ilusões visuais, auditivas, ou outras. Isso mostra não ser adequado confiarmos nos nossos sentidos, pelo que nenhuma crença baseada neles está adequadamente justificada.
Ainda assim, podemos sempre justificar umas crenças com outras crenças. Vamos, então, supor que justificamos uma dada crença com outra crença. Esta última terá, por sua vez, de ser justificada por uma terceira, e esta por uma quarta, e assim sucessivamente, até ao infinito. Ora, este processo de regressão infinita da justificação acaba por nos deixar sem qualquer ponto de sustentação, pelo que nenhuma crença é adequadamente justificada. Mesmo que decidíssemos parar num dado ponto do processo, isso seria arbitrário e ficaríamos com todas as outras crenças apoiadas numa crença injustificada.
Dado que a justificação é uma condição necessária do conhecimento e nenhuma crença está apropriadamente justificada, segue-se que nenhuma crença é conhecimento.
Em resumo:
- Podemos ter conhecimento de coisas, conhecimento prático e conhecimento declarativo (ou proposicional). O que nos interessa aqui é este último.
- Tradicionalmente são indicadas pelo menos três condições necessárias do conhecimento, em sentido proposicional: a crença, a verdade e a justificação.
- A justificação é a mais problemática das três ainda que costumem ser apontadas duas fontes principais de justificação: o pensamento ou razão (a priori) e os sentidos ou experiência (a posteriori).
- Os racionalistas defendem que o fundamento do conhecimento é a razão: o conhecimento tem um fundamento a priori; os empiristas defendem que o fundamento do conhecimento é a experiência (é a posteriori).
- Os céticos consideram que nenhuma destas fontes de justificação é confiável e que nenhuma justificação é apropriada, o que torna impossível o conhecimento.
- Três dos principais argumentos céticos são: o das opiniões divergentes, o das ilusões dos sentidos e o da regressão infinita da justificação.
Temas
Ficha Técnica
- Título: A possibilidade de conhecimento: o desafio cético
- Área Pedagógica: Filosofia
- Tipologia: Explicador
- Autoria: Aires de Almeida
- Ano: 2020
- Imagem: Foto de Monstera no Pexels