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História Trágico-Marítima: narrativas de naufrágios da época das conquistas

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A História Trágico-Marítima é uma coleção de relatos de naufrágios, ocorridos nos séculos XVI e XVII. Neles assistimos às atribuladas e difíceis viagens de navios portugueses, marcadas por tempestades e naufrágios, ataques de corsários, fome, desespero e morte.

Resumo

A História Trágico-Marítima: Narrativas de naufrágios da época das conquistas é uma coletânea de relatos de naufrágios de navios portugueses ocorridos entre o final do século XVI e meados do século XVII. Inicialmente, tais narrativas foram publicadas em folhetos, por sobreviventes dos naufrágios ou por testemunhas. Já no século XVIII, foram reunidas e publicadas em dois volumes por Bernardo Gomes de Brito.

Em geral, essas narrativas focam os antecedentes da viagem, o momento da partida (condições da nau, características da carga, início da navegação), tempestades e naufrágios (descrição da tempestade, danos materiais daí advenientes, afundamento da nau) ou ataques de corsários (destruição parcial da nau, captura da mesma e aprisionamento dos portugueses sobreviventes) e, por fim, a chegada à pátria dos marinheiros sobreviventes.

Personagens

Jorge de Albuquerque Coelho: Capitão da nau portuguesa “Santo António”, age como um líder determinado e ponderado, imbuído de um espírito de abnegação, humanidade e fraternidade.

Restante tripulação: personagem coletiva que contribui para caracterizar o ambiente social das viagens (medo, desespero, degradação humana).

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Temática e texto

Os textos integrados na História Trágico-Marítima têm grande valor documental e literário. Por um lado, reproduzem “as atribuladas viagens dos portugueses que deixavam o reino ou a ele regressavam e descrevem, com grande pormenor realista e cinético, os vastos cenários de impiedosas procelas e toda a sorte de padecimentos físicos e espirituais que atormentavam os navegantes lusitanos” (Custódio, 1997), contribuindo, por isso, para a caracterização da cultura e da sociedade do século XVII.

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Para além de evidenciarem as condições físicas, sociais e psicológicas em que decorriam as viagens, estas narrativas dão conta da forma como a gestão das rotas marítimas era feita: as naus estavam em mau estado de conservação e/ou eram armadas à pressa, por vezes com carga excessiva, pondo em causa a segurança; nem sempre os oficiais e os pilotos que comandavam e dirigiam as naus se revelavam peritos nas tarefas de que estavam incumbidos; não se respeitavam as normas que regulamentavam os períodos e as rotas favoráveis à navegação; as naus não estavam preparadas para se defender dos ataques corsários (Lanciani, 1979).

Por outro lado, os relatos de naufrágios retratam “com originalidade, através dos níveis da diegese e do discurso, o perfil do navegante português de Quinhentos, objeto primordial das atenções dos narradores” (Balula, 1997). No caso do relato “As terríveis aventuras de Jorge de Albuquerque Coelho (1565)”, o navegante português destacado pelo narrador é Jorge de Albuquerque.

Chefe militar de uma capitania de Pernambuco, depois de conquistada a colónia, Albuquerque embarca para a metrópole, na qualidade de capitão da nau de “Santo António”. Durante a viagem, revela grande capacidade de liderança, partilhando tarefas com os seus marinheiros, preocupando-se com eles e transmitindo-lhes ânimo e motivação (“Jorge de Albuquerque, além dos trabalhos comuns aos outros – pois de todos irmãmente partilhava ele – tinha ainda o cuidado de prover a tudo, e o de comandar, consolar, animar os homens, comunicar o seu fogo à companhia inteira; e em tão amigos, tão brandos, tão piedosos termos lhes falava sempre, que quase sem forças se levantava a gente: rediviva, pronta – retomava a faina.”). Em momentos particularmente difíceis, por exemplo, de fome extrema, o seu comportamento ponderado e determinado, contrasta com o desespero, a desorientação e o descontrolo da restante tripulação.

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Baseadas no relato de comportamentos verídicos, as narrativas de naufrágios testemunham o lado antiépico dos Descobrimentos. No caso do relato atrás referido, a brutalidade das condições de navegação é amplamente exposta: durante a viagem, os marinheiros passam “muita fome e muita sede”, envolvem-se em “grandes brigas e discórdias”; ao serem capturados por corsários franceses, Albuquerque e a tripulação tentam defender-se, em vão, por falta de “petrechos de guerra”. A nau de “Santo António” é, assim, pilhada, e os marinheiros portugueses são aprisionados durante algum tempo, acabando por ser abandonados ao seu destino. Vogando ao sabor do vento e sujeitos a uma fome extrema e na iminência da morte, os sobreviventes conseguem, por fim, chegar à pátria, sem riquezas e completamente despojados.

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Bibliografia sumária:

Sérgio, António (adaptação) (2009). História Trágico Marítima: Narrativas de naufrágios da época das conquistas. Lisboa: Sá da Costa.

Custódio, Pedro Balaus (1997). História Trágico-Marítima”, in Biblos – Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua portuguesa (cols. 1060-1061). Lisboa: Verbo.

Koiso, Kioko (2005). “História Trágico-Marítima”. In Instituto Camões, http://cvc.instituto-camoes.pt/navegaport/f04.html

Lanciani, Giulia (1979). Os relatos de naufrágios na literatura portuguesa dos séculos XVI e XVII. Lisboa: ICP.

Sumário

  • A dimensão antiépica da História Trágico-Marítima: a realidade das navegações portuguesas da época dos Descobrimentos (tempestades, naufrágios, ataques de corsários).
  • O valor histórico dos relatos de naufrágios: gestão das rotas marítimas, características das naus, condições da vida a bordo.
  • O perfil do navegante Português no relato da viagem de Jorge Albuquerque Coelho: o contraste entre a racionalidade e a firmeza do capitão e o desespero e descontrolo dos restantes marinheiros.

Temas

Ficha Técnica

  • Título: História Trágico-Marítima
  • Área Pedagógica: Português - Educação Literária
  • Tipologia: Explicador
  • Autoria: Noémia Jorge/ Associação de Professores de Português (APP)
  • Ano: 2021