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O naturalismo e as vanguardas artísticas em Portugal

O naturalismo e as vanguardas artísticas em Portugal

As primeiras décadas do século XX em Portugal são marcadas por uma ruptura vanguardista que se opunha à persistência do naturalismo, ao academismo e de um pensamento que consideravam conservador. A capacidade de coordenar a literatura e as artes plásticas, a vontade de ruptura com qualquer convencionalidade e o antagonismo em relação ao público e a um gosto oficial vão marcar profundamente este momento.

As primeiras décadas do século XX em Portugal são marcadas por uma sucessão de tentativas de suplantar formas de entendimento da arte que se haviam cimentado em finais do século XIX, procurando afirmar práticas artísticas que se incluíam e dialogavam com a ruptura vanguardista que atravessava todo o mundo da arte.

Contrapunham-se à persistência de um naturalismo promovido ainda pela Sociedade Nacional de Belas-Artes, cujo primeiro presidente, o pintor José Malhoa, integrara o Grupo do Leão. Este grupo, que agregou pintores e escritores, foi fundamental para a introdução e desenvolvimento do naturalismo em Portugal.

Opunham-se igualmente ao ensino da Escola de Belas-Artes, ainda de forte raiz académica, bem como à persistência de um pensamento que consideravam conservador, envolvendo-se em polémicas com José de Figueiredo, historiador e crítico de arte que dirigiu o Museu Nacional de Arte Antiga, ou Júlio Dantas, que além de médico ou diplomata, foi escritor.

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Um primeiro afloramento daquela ruptura dá-se na Exposição dos Livres de 1911, onde artistas que haviam estudado em Paris reclamavam não ter mestres, nem seguir escolas, afirmando porém encontrar ainda na natureza o seu modelo.

Em 1912, o I Salão dos Humoristas afastava-se mais claramente do naturalismo, através de uma prática ligada ao desenho de tiras humorísticas e à ilustração para a imprensa, onde a síntese das figuras era nota predominante. Entre os humoristas encontravam-se artistas como Cristiano Cruz, Jorge Barradas ou Almada Negreiros.

Dois anos depois, com o início da Primeira Guerra Mundial, regressam a Portugal uma série de autores que haviam completado a sua formação artística em Paris como bolseiros do estado ou a expensas próprias. Entre estes contavam-se Eduardo Viana, José Pacheko, Santa-Rita e Amadeo de Souza-Cardoso. Apesar das diferenças entre os seus trabalhos, estes artistas praticam uma pintura marcada pelo uso de fortes contrastes de cor, pela decomposição, simplificação ou deformação das figuras, numa composição que abandona progressivamente a rigidez das relações entre forma e fundo. Igualmente importante para o desenvolvimento de novas práticas artísticas, nomeadamente pelos estudos de contrastes simultâneos, foi o exílio de Robert e Sonia Delaunay em Vila do Conde, onde trabalham com Amadeo e Eduardo Viana.

O período entre 1915 e 1917 marca o momento mais forte de afirmação do modernismo em Portugal e expõe a ruptura vanguardista em toda a sua plenitude. Em 1915 são publicados os dois números da revista Orpheu onde, entre outros, surgem textos de Mário de Sá-Carneiro, Fernando Pessoa e Almada Negreiros. São reproduzidos desenhos de Santa-Rita ou José Pacheko, surgindo ainda António Ferro como um dos editores do primeiro número.

Estala a polémica entre os autores associados à revista Orpheu e figuras como José de Figueiredo ou Júlio Dantas, motivando a publicação por Almada Negreiros do Manifesto Anti-Dantas e por extenso, logo em 1915.

Em 1917 tem lugar a Conferência Futurista e a publicação do número único da revista Portugal Futurista, onde escrevem novamente Fernando Pessoa e Almada, incluindo-se, entre outros, poemas de Guillaume Apollinaire e Blaise Cendrars e um manifesto por Marinetti, que havia publicado o Manifesto Futurista em 1909.

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O lado performativo da conferência, que é destacado em texto na revista, a capacidade de coordenar a literatura e as artes plásticas, a vontade de ruptura com qualquer convencionalidade e o antagonismo em relação ao público e a um gosto oficial vão marcar profundamente este momento.

Entretanto, em 1916, Amadeo de Souza-Cardoso realizara duas exposições, no Porto e em Lisboa, onde o seu domínio sobre a produção e técnicas de montagem de exposição mostrava o contacto prolongado com uma realidade parisiense em que o mercado da arte se encontrava já em pleno funcionamento.

De resto, a inexistência na prática de um mercado da arte em Portugal e a incapacidade do Museu Nacional de Arte Contemporânea em adquirir obras vão reforçar a importância da encomenda de pintura por clubes ou cafés, como a Brasileira do Chiado ou o Clube Bristol. Se os cafés e clubes foram determinantes para o encontro de artistas e intelectuais desde o século XVIII, nestes dois casos funcionavam ainda como espaços onde era possível ver expostas obras de artistas como Almada Negreiros, Viana, Pacheko ou Barradas.

Já no contexto da ditadura militar é criada em Coimbra, em 1927, a Revista Presença, na qual colaboram alguns autores ligados à revista Orpheu. Opondo-se ao academismo e apelando a um forte sentido crítico, nela trabalharão artistas ligados ao I Salão dos Independentes, de 1930, como Mário Eloy, Diogo de Macedo, Sarah Afonso ou Vieira da Silva.

Síntese:

  • O início do século XX em Portugal é marcado por uma ruptura vanguardista.
  • A vanguarda modernista opunha-se ao naturalismo, ao academismo e ao conservadorismo.
  • O modernismo vai aliar as várias artes, romper com a convencionalidade e opor-se ao gosto oficial.

Temas

Ficha Técnica

  • Área Pedagógica: Portugal: entre o naturalismo e as vanguardas.
  • Tipologia: Explicador
  • Autoria: Associação dos Professores de História/André Silveira
  • Ano: 2021
  • Imagem: Emérico Nunes, Manuel Bentes, Amadeo de Souza Cardoso e Alexandre Ferraz de Andrade em 1918, Calouste Gulbenkian Art Library.