A História da Arte
O momento fundador da História da Arte situa-se geralmente a partir de As vidas dos mais célebres pintores, escultores e arquitectos italianos de Giorgio Vasari, de 1550, ou da edição em 1764 de História da Arte Antiga, por Johann Joachim Winckelmann. No entanto, é a segunda obra que reúne maior consenso, ao construir um modelo temporal e explicativo da história da arte que integra preocupações formais e contextuais. A partir do século XIX, a História da Arte vai alargando a sua abrangência, não se cingindo apenas às belas-artes, problematizando igualmente os seus modelos temporais e de abordagem ao fenómeno artístico.
Existiram ao longo da história casos como o de Plínio, o Velho (23-79), que na sua História Natural, de 77, integra referências a objetos artísticos, artistas e comentários sobre arte. Contudo, o momento fundador da História da Arte situa-se geralmente a partir de uma de duas obras: a publicação em 1550 de As vidas dos mais célebres pintores, escultores e arquitetos italianos, de Cimabue ao nosso tempo, por Giorgio Vasari (1511-1574), ou a edição em 1764 de História da Arte Antiga, por Johann Joachim Winckelmann (1717-1768).
Apesar da obra de Vasari consistir na sua maioria numa compilação de biografias de artistas, a sua alusão neste contexto relaciona-se com a proposta de um modelo temporal e explicativo da produção artística entre os séculos XIII e XVI, que o italiano vai articular com a Antiguidade. Colocando como problema central a resolução realista da representação, este modelo definia-se por ciclos de nascimento, maioridade e declínio, com um primeiro pico na Antiguidade e um outro na sua contemporaneidade, num crescendo que se registava desde Cimabué (c.1240-1302). Uma visão da arte que expunha a mundividência renascentista e, além disso, afirmava Florença como o local onde se concentravam as maiores realizações artísticas do tempo.
O trabalho de Winckelmann, porém, é o que reúne maior consenso quanto à definição de um momento inicial da disciplina, fixando-o no século XVIII. Em História da Arte Antiga o autor alemão recorre a uma modelação temporal semelhante à de Vasari, classificando períodos do desenvolvimento da arte da antiguidade grega, sistematizando-a por estilos. Progredindo desde um estilo arcaico, atingia o auge no século IV a.C. e declinava daí em diante. Mas, como a sua alusão enquanto um dos fundadores da arqueologia moderna sugere desde logo, a metodologia de trabalho que emprega afastava-se da coleção de relatos biográficos, estando mais dependente de uma atenção ao objeto, num empirismo que de certo modo justificava a cientificidade da disciplina. De resto, encontrou na definição de um ideal de belo no período clássico grego a confluência entre uma prática artística e condições políticas, sociais e culturais democratizantes.
O que sustentará parte da reação de finais do século ao Barroco e ao Rococó, afirmando-se o Neoclassicismo a par da Revolução Francesa. Este estabelecimento de uma relação entre a produção artística e os seus contextos político, social, cultural e económico irá persistir como uma das linhas de fundo da História da Arte, apesar das diferenças que essa conexão vai assumir ao longo do tempo.
Ao longo do século XIX a disciplina irá institucionalizar-se em definitivo, já depois da afirmação em setecentos de uma autonomia da arte face à literatura, que colocava a sua discussão em torno de problemas que lhe eram específicos. Encontrando-se também aí as bases de um formalismo que já se denotava na sistematização por estilos de Winckelmann, a História da Arte desenvolve-se a par dos museus, locais onde se materializava a organização temporal e geográfica dos objetos artísticos, sendo igualmente no século XIX que se inicia a integração da disciplina nos currículos universitários. Porém, o modelo temporal de oitocentos afasta-se já dos de Vasari e Winckelmann, fomentando a noção de um tempo linear de desenvolvimento contínuo e, por outro lado, reavaliando momentos da história da arte entendidos como degenerações dos ideais clássicos, casos de Renascimento e Barroco, publicado em 1888 por Heinrich Wölfflin (1864-1945), ou A Arte Industrial Tardo Romana, livro de Alois Riegl (1858-1905), já de 1901.
Por estes anos, Aby Warburg (1866-1929) irá propor uma leitura histórica da arte que beneficiará de uma prática transdisciplinar, através de aportações da antropologia ou da etnografia, bem como da psicologia da arte. O que permitirá quebrar aquele tempo linear através de recorrências formais ao longo da história, expressas no seu Bilderatlas Mnemosyne, obra inacabada que compõe a partir de 1927. Abrindo ainda o campo para o desenvolvimento da Iconologia, que ganhará especial relevo no mundo anglo-saxónico após a Segunda Grande Guerra através do trabalho de Erwin Panofsky (1892-1968).
Ainda na primeira metade do século XX, Walter Benjamin (1892-1940) analisa o campo cultural recorrendo não só, mas também, a uma grelha de pensamento marxista, ainda que o seu posicionamento seja diferente do de Arnold Hauser (1892-1978) em História Social da Arte (1951). As propostas de Benjamin virão a ser fundamentais para o estudo da arte realizado nos Estados Unidos dos anos 1960 em diante, nomeadamente através do trabalho de Rosalind Krauss (1941) e da revista October (1976), um dos espaços responsável pela divulgação do pós-estruturalismo francês no mundo anglo-saxónico e pela crítica ao modelo formalista de Clement Greenberg (1909-1994). Sensivelmente deste período em diante, fruto das aportações pós-estruturalistas, da semiologia, mas também do desenvolvimento das teorias feministas, queer ou pós-coloniais, dá-se uma revisão profunda do campo de estudos da História da Arte, incorporando ainda o pensamento avançado pelos Estudos Culturais britânicos já desde os anos 1960.
Como se entende nesta síntese, desde o século XIX a História da Arte vai alargando paulatinamente a sua abrangência, não se cingindo apenas às belas-artes, problematizando igualmente os seus modelos temporais e de abordagem ao fenómeno artístico. Circulando fundamentalmente entre os polos formalista e contextual, a disciplina definir-se-á também pela sua relação com a estética, discutindo de que modo os seus objetos de estudo são produto ou produtores de alterações na relação sensível com o mundo e, neste sentido, de como a partir deles se pode constituir um campo de conhecimento.
Síntese
- O momento fundador da História da Arte situa-se geralmente a partir de As vidas dos mais célebres pintores, escultores e arquitectos italianos de Giorgio Vasari, de 1550, ou da edição em 1764 de História da Arte Antiga, por Johann Joachim Winckelmann.
- É a obra de Johann Joachim Winckelmann que reúne maior consenso, ao construir um modelo temporal e explicativo da história da arte que integra preocupações formais e contextuais.
- A partir do século XIX a História da Arte vai materializar-se nos museus e integrar currículos universitários, alargando depois a sua abrangência para além das belas-artes, problematizando continuamente os seus modelos temporais e de abordagem ao fenómeno artístico.
Ficha Técnica
- Título: A História da Arte
- Tipologia: Explicador
- Autoria: Associação de Professores de História/André Silveira
- Ano: 2021
- Imagem: Johann Joachim Winckelmann